O que este Papa quis dizer com isso em meio às agitações que marcaram a década de 1970 e que permearam a cultura até a nossa época?
O dia 29 de maio é o da festa litúrgica do Papa São Paulo VI, canonizado por Francisco em 14 de outubro de 2018. A data foi escolhida por ser o dia da sua ordenação sacerdotal.
Seu nome de batismo é Giovanni Battista Montini. Ele nasceu na Lombardia em 26 de setembro de 1897 e partiu desta vida em Castel Gandolfo no dia 6 de agosto de 1978, após 15 anos de pontificado.
São Paulo VI é particularmente recordado como o autor da importantíssima encíclica Humanae Vitae, que defende enfaticamente a sacralidade da vida e da família. Ele também é o pontífice que encerrou o Concílio Vaticano II, aberto em 1962 por seu predecessor, o Papa São João XXIII.
Vaticano - Domínio Público
Fumaça na Igreja
É no contexto das intensas transformações culturais relacionadas com a época do concílio e do pós-concílio que São Paulo VI faz uma das declarações mais retumbantes de um Papa em todos os tempos:
“A fumaça de Satanás entrou no templo de Deus”.
O começo da década de 1970 foi um tempo de grande agitação no mundo e na Igreja, com consequências culturais que se prologam até hoje. Nessa imediata época pós-Concílio Vaticano II, o Papa Paulo VI escreveu uma carta que permaneceria inédita até 2018, quando o conteúdo foi revelado no livro “La barca di Paolo” (“A barca de Paulo“), do pe. Leonardo Sapienza, regente da Casa Pontifícia.
A carta é de 29 de junho de 1972. Paulo VI tem cada vez mais nítida a impressão de que existe algo de profundo e negativo que aflige a Igreja de modo crescente. O caminho da secularização e a falta de unidade interna estão se tornando dois grandes problemas para a Igreja no mundo inteiro.
Inquieto, o Papa escreve:
“…Diríamos que, por alguma fresta misteriosa – não, não é misteriosa; por alguma fresta, a fumaça de Satanás entrou no templo de Deus. Há dúvida, há incerteza, há problemática, há inquietação, há insatisfação, há confronto”.
“Não se confia mais na Igreja. Confia-se no primeiro profeta profano que vem nos falar em algum jornal, para correr atrás dele e lhe perguntar se tem a fórmula para a vida verdadeira. Entrou, repito, a dúvida em nossa consciência. E entrou por janelas que deviam estar abertas à luz: a ciência!”
Nuvens de tempestade
“…Acreditava-se que, depois do Concílio, viriam dias ensolarados para a história da Igreja. Advieram, porém, jornadas de nuvens, de tempestade, de escuridão, de busca, de incerteza… Tentamos cavar abismos em vez de preenchê-los…”.
Terror e êxtase
Que o Papa não estava tranquilo, percebe-se ainda por outro pensamento que ele tinha escrito oito dias antes, em 21 de junho de 1972. O título, por si, já é perturbador: “O terror e o êxtase“.
Talvez o Senhor
me tenha chamado a este serviço
não já para que eu tome nele alguma atitude,
ou para que eu governe e salve a Igreja das suas dificuldades,
mas para que eu sofra algo pela Igreja
e seja claro que é Ele, e ninguém mais,
quem a guia e quem a salva.
21 de junho de 1963: exatos nove anos antes de escrever esse pensamento, Giovanni Montini era eleito Papa. E, a respeito, tinha escrito:
“…Espero que todos acreditem quando digo que não apenas nunca aspirei como sequer formulei a hipótese de ser eleito para este formidável ofício…”.
Anos depois, em conversa no turbulento 1968 com o escritor francês Jean Guitton, seu amigo, o Papa confidenciava:
“…Eu tive o terror e o êxtase de ser eleito…”.
Uma vez aceito o peso do pontificado, porém, Paulo VI lhe consagrou todas as forças, em meio aos incontáveis obstáculos que, a ele e a qualquer outro pontífice, teriam feito, certamente, pensar na renúncia.
É gravemente pesado o fardo do Vigário de Cristo, porque é o fardo do pastor chamado a dar a vida pelas ovelhas.
Oremos sempre pelo Papa e pela Igreja, sob as nuvens de tempestade.
Fonte: Aleteia
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