Por Bruno de Barros
Há 134 anos, uma encíclica mudou o mundo do trabalho. Em 2025, um novo papa reacende o ideal da justiça social diante de desafios globais e da revolução digital
Quando Robert Francis Prevost foi apresentado ao mundo como Leão XIV, o primeiro papa americano e o primeiro da Ordem de Santo Agostinho a ocupar o trono de Pedro, um detalhe chamou a atenção de estudiosos e fiéis: a escolha do nome. Em tempos de transformações sociais e tecnológicas profundas, sua homenagem direta a Leão XIII resgatou um marco histórico da doutrina social da Igreja — a encíclica Rerum Novarum, publicada em 1891, que lançou as bases do Direito do Trabalho moderno.
Mais que um gesto simbólico, a escolha aponta para uma missão: reconectar fé e justiça em um mundo cada vez mais desigual. "É como se dissesse: ‘Quero retomar essa luta por dignidade no trabalho, mas agora diante de novos desafios’", afirma Bruno de Barros, sócio do escritório Durães e Barros Advogados, especializado em Direito do Trabalho e consultoria estratégica para empresas há mais de 15 anos.
Um documento que mudou o rumo da história
No final do século XIX, o cenário era desolador: jornadas de 16 horas, trabalho infantil, salários miseráveis e ausência de qualquer proteção legal. Entre os extremos do capitalismo selvagem e do socialismo radical, Leão XIII ousou propor uma terceira via: ética no trabalho, respeito à dignidade humana e responsabilidade social. Assim nasceu a Rerum Novarum — em latim, “das coisas novas”. Foi a primeira vez que um livro papal trazia questões que se contrapunham aos interesses do Estado e pressionou uma mudança de comportamento e a regulação das relações de trabalho.
“O que Leão XIII fez foi revolucionário. Ele humanizou o trabalho em um tempo em que o trabalhador era tratado como engrenagem. Trouxe uma visão que conciliava progresso com humanidade”, explica Barros.
A encíclica defendeu pilares que ainda ecoam nas legislações trabalhistas contemporâneas:
Trabalho com dignidade: pessoas não são mercadorias, e o trabalho deve servir à vida, não à exploração.
Salário justo: o trabalhador deve receber o suficiente para manter a si e à sua família com dignidade.
Direito à organização: os sindicatos foram reconhecidos como instrumentos legítimos de luta por condições mais justas.
Propriedade com função social: o direito à propriedade é legítimo, mas deve servir ao bem comum.
Estado regulador: cabe ao poder público proteger os mais frágeis e garantir o equilíbrio entre capital e trabalho.
“Essa doutrina reflete, de forma indireta, a criação da CLT no Brasil e inspirou a atuação de figuras históricas como Getúlio Vargas”, lembra o especialista.
Leão XIV: um nome que aponta para o futuro
Desde o século VI, papas adotam nomes simbólicos ao assumir o pontificado. Ao escolher “Leão”, Prevost se alinha a uma linhagem de coragem e transformação. Leão XIII foi conhecido como o "papa dos trabalhadores"; Leão XIV desponta como o pontífice dos invisíveis da era digital.
“Vivemos tempos em que o trabalho está mudando de forma e significado. O papa Leão XIV parece consciente disso, e sua formação matemática, aliada à vivência missionária no Peru, pode trazer uma abordagem inovadora, ética e realista sobre o mundo do trabalho contemporâneo”, avalia Bruno.
Se Leão XIII enfrentou a Revolução Industrial com inteligência política e sensibilidade humana, Leão XIV se depara com uma nova revolução — a digital. Questões como gig economy, inteligência artificial, ESG, mudanças climáticas, proteção de dados e reformulações fiscais globais exigem um novo olhar ético.
“Ambos se posicionam contra os extremos. Rejeitam tanto o lucro desenfreado quanto a supressão da iniciativa individual. Buscam o equilíbrio entre direitos e deveres, entre progresso e empatia”, destaca Barros.
Leão XIV também é o primeiro papa da Ordem de Santo Agostinho, cujos valores centrais são o estudo, a interioridade e a vida comunitária. “Sua formação filosófica e espiritual pode ajudá-lo a propor um novo pacto social global, ancorado na justiça, no diálogo e no bem comum”, completa.
Por que a Rerum Novarum ainda é urgente em 2025?
Apesar dos avanços legais, o mundo do trabalho enfrenta dilemas complexos:
Trabalho digital: plataformas como Uber e iFood criaram novos modelos de emprego, mas também fragilizaram direitos e proteções básicas.
Escala 6x1 no Brasil: o debate da mudança na tradicional escala está aceso e o posicionamento de Leão XIV pode influenciar na votação
Reforma tributária: com a implementação do IBS/CBS, pequenas e médias empresas buscam formas de manter benefícios aos funcionários sem comprometer sua sustentabilidade.
Tarifas comerciais: a retomada de políticas protecionistas, como o “tarifaço” dos EUA sobre produtos estrangeiros, pressiona cadeias produtivas e o emprego formal.
ESG como imperativo: mais do que diferencial competitivo, a responsabilidade social virou pré-requisito de sobrevivência empresarial.
Automação e IA: a substituição de funções humanas por algoritmos exige políticas que garantam requalificação e inclusão.
“É tempo de resgatar a ideia de que o trabalho deve humanizar, não desumanizar. E de lembrar que o lucro, por si só, não justifica tudo. A Rerum Novarum segue viva — e Leão XIV pode ser sua voz no século XXI”, conclui Bruno de Barros.
Sobre a Durães e Barros Advogados:
A Durães e Barros Advogados é referência em direito tributário, empresarial, trabalhista e imobiliário. Com uma relação sólida com o bairro do Brás, uma das áreas mais importantes para o comércio em São Paulo, o escritório combina décadas de experiência com a expertise internacional de seus sócios Hellen Durães e Bruno de Barros. A Durães & Barros atende uma ampla gama de empresas, oferecendo soluções jurídicas sob medida, com foco no crescimento e na proteção de negócios.
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