Encontro privado do papa com jesuítas ontem (11) em Singapura. | Vatican Media
Por Redação central ,
Almudena Martínez-Bordiú
12 de set de 2024 às 10:36
O papa Francisco quer que o padre espanhol Pedro Arrupe, superior-geral dos jesuítas entre 1965 e 1983, seja beatificado e canonizado. O papa falou disso em encontro privado ontem (11) com sacerdotes jesuítas em Singapura.
O anúncio foi feito ao Vatican News, serviço oficial de informações da Santa Sé, pelo padre jesuíta Antonio Spadaro, subsecretário do Dicastério para a Cultura e membro da delegação papal na viagem do papa à Ásia e à Oceania, a quem cabe a divulgação do que o papa fala a seus confrades jesuítas em cada país que visita em suas viagens internacionais.
Um grupo de 25 jesuítas tiveram a oportunidade de falar ontem (11) com o papa e fazer-lhe perguntas num encontro que durou cerca de uma hora na casa de retiros São Francisco Xavier, residência do papa durante sua estadia em Singapura.
“Havia alguns jovens, até mesmo um recém-ordenado, e alguns mais velhos, alguns até doentes. O papa foi muito carinhoso com eles”, disse o padre Spadaro.
Spadaro disse também que foi um encontro cordial e fraterno, numa atmosfera “íntima e familiar”.
O papa disse também que a fé “deve entrar nos desafios humanos” e falou sobre a importância da oração, ao citar a Ásia como um “continente-chave”.
Depois, Francisco encorajou-os a “sempre enfrentar os desafios colocados pela sociedade com um espírito de oração seguindo o modelo do padre Pedro Arrupe”.
O padre espanhol foi superior geral dos jesuítas de 1965 a 1983, proclamado servo de Deus em 2019 e está com a causa de beatificação em curso.
Quando Arrupe assumiu o cargo, Jorge Mario Bergoglio era um jesuíta de 29 anos com quatro anos de votos perpétuos e ainda a quatro anos de sua ordenação sacerdotal.
Arrupe era uma personalidade global com trânsito e influência muito além da ordem que dirigia e o papa Francisco mostra ter sido muito influenciado por seu superior geral. De Arrupe, vem, por exemplo, a preocupação com os migrantes que tanto marca o papa Francisco. Impressionado com o destino dos “boat people”, vietnamitas que fugiram aos milhares dos comunistas que se instalaram no poder com o fim da guerra do Vietnã, em 1975, e, recusados em todos os países, viveram nos barcos em que fugiram durante anos, Arrupe, que foi provincial dos jesuítas na Ásia, criou um setor específico na ordem para cuidar de refugiados e tornou o tema central para a ordem.
Arrupe era delegado dos jesuítas no Concílio Vaticano II quando o padre Jean Baptiste Janssens, o holandês que fora superior geral dos jesuítas desde 1949, morreu. Janssens havia introduzido na ordem a ideia de “apostolado social”, segundo a qual os jesuítas têm a dupla missão de evangelizar e promover a justiça social.
Respondendo se apoiava os progressistas de sua ordem, Arrupe disse: “Se por progressista se entende aquele que combate as grandes injustiças sociais existentes em todas as partes do mundo, mas sobretudo nos países em vias de desenvolvimento, nós estamos com eles na linha da doutrina social contida nas grandes encíclicas”.
Foi também na Companhia de Jesus sob o comando de Arrupe que, pela primeira vez na história da Igreja, se propôs uma mudança na doutrina moral da Igreja para permitir uma avaliação positiva da homossexualidade. O tema, defendido hoje pelo arcebispo de Luxemburgo, cardeal Jean Claude Hollerich SJ, relator geral do Sínodo da Sinodalidade, e pelo também jesuíta James Martin, convidado pelo papa para tomar parte no sínodo, foi introduzido pelo jesuíta John J. McNeill, americano como Martin, no livro A Igreja e a Homossexualidade, publicado em 1976 e condenado pela Congregação para a Doutrina da Fé. Em fevereiro do ano passado, Hollerich respondeu uma pergunta da agência de notícias católica alemã KNA dizendo achar que está errada a ideia de que o homossexualismo é pecado. “A maneira como o papa se expressou no passado pode levar a uma mudança na doutrina”, disse o cardeal. “Porque acredito que o fundamento sociológico-científico desse ensinamento não é mais correto”, alegou Hollerich sem citar McNeill, mas usando o mesmo argumento exposto no livro de 1976.
Na mesma primeira entrevista, Arrupe defendeu o teólogo jesuíta Teilhard de Chardin (1881-1955). Paleontólogo, além de teólogo, Chardin via a ciência como caminho para tornar o cristianismo relevante para o homem moderno. Seu projeto foi tentar fazer a visão cristã aceitável para alguém com uma visão de mundo científica. Partindo do conceito de evolução defendido por Charles Darwin, Teilhard de Chardin foi o primeiro a formular a ideia de que Deus é o ponto culminante da evolução do universo criado, rompendo, assim, a divisão radical entre imanência, o que pertence à ordem do criado, e transcendência, a esfera própria de Deus.
“A meta do caminho do universo situa-se na plenitude de Deus, que já foi alcançada por Cristo ressuscitado, fulcro da maturação universal”, escreveu o papa Francisco no número 83 de sua encíclica Laudato sì, remetendo explicitamente, em nota de rodapé, à “contribuição do P. Teilhard de Chardin”.
“O fim último das restantes criaturas não somos nós. Mas todas avançam, juntamente conosco e através de nós, para a meta comum, que é Deus, numa plenitude transcendente onde Cristo ressuscitado tudo abraça e ilumina”, escreve o papa reabilitando informalmente o padre Teilhard de Chardin. O então Santo Ofício, depois Congregação e hoje Dicastério para a Doutrina da Fé, havia condenado as teses do jesuíta em 1962 por conterem “ambiguidades tais, e até mesmo graves erros, a ponto de lesar a doutrina católica”.
“Várias vezes o papa Francisco falou da figura desse grande padre geral e declarou que está muito próximo a ele e ansioso para chegar a essa beatificação e canonização”, disse Spadaro.
O papa também falou com os jesuítas sobre as vocações ao sacerdócio e encorajou-os a “diminuir as exigências”, já que muitos jovens sentem a vocação, mas “se assustam com a formação”.
O papa também falou sobre o exemplo do padre jesuíta Matteo Ricci, “grande apóstolo jesuíta da China” e um “ponto de referência” para os jesuítas. Matteo Ricci foi o criador do que se chama hoje “inculturação”. Ele propôs, no século XVII, que o culto aos antepassados fosse acrescentado à doutrina católica na China, para facilitar a evangelização. Sua ideia não foi aceita pela Santa Sé.
No final do encontro, um dos padres aproximou-se do papa Francisco com várias bolsas contendo petições escritas por fiéis do país. O papa colocou a mão sobre elas e rezou em silêncio.
Fonte: ACI digital
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