Igreja Maria Lanakila em Lahaina, Maui (Havaí) / Hawai'i Dept of Land & Natural Resources | Joel Bradshaw, Public Domain
John Touhey - Francisco Vêneto - publicado em 14/08/23
Pode ser considerado um milagre? Saiba o que diz a doutrina católica sobre episódios desse tipo
A igreja católica de Maria Lanakila, na ilha havaiana de Maui, ficou surpreendentemente ilesa durante os incêndios históricos que devastaram praticamente toda a área circundante. A tragédia no Havaí já se tornou a maior de todos os tempos nos Estados Unidos no tocante a incêndios florestais, com o número de vítimas fatais chegando perto de 100 até este domingo – e ainda podendo aumentar.
Vídeos chocantes mostram a vastidão da destruição na cidade histórica de Lahaina. Tudo levaria a crer que também havia pegado fogo a igreja católica local, cujo nome, “Maria Lanakila”, significa “Maria Vitoriosa” ou “Nossa Senhora da Vitória” na língua havaiana. Quando os residentes começaram a receber autorização para retornar à cidade, porém, as suas fotos e vídeos revelaram que a igreja e a casa paroquial tinham permanecido em pé, contrastando com os edifícios próximos, reduzidos a cinzas.
Hawai’i Dept of Land and Natural Resources
“Para nós, é como um milagre”, declarou ao jornal Honolulu Star Advertiser o monsenhor Terrence Watanabe, pároco da paróquia de Santo Antônio de Pádua. Em contrapartida, ele também observa que “as pessoas estão chocadas e um tanto arrasadas”, precisando de toda a ajuda possível, tanto em orações quanto em todo tipo de doação. De fato, a Catholic Charities of Hawai’i lançou uma campanha de emergência pedindo ajuda para a população.
Num contexto tão terrível, com quase uma centena de mortos e com os sobreviventes precisando urgentemente de ajuda, faz sentido tentar enxergar um milagre numa igreja que permaneceu de pé?
É um milagre?
Não. Não se pode falar tecnicamente em milagre quando existem explicações científicas plausíveis para um acontecimento. Neste caso, uma gama considerável de variáveis é capaz de explicar por que um incêndio de grandes proporções pode ter deixado um edifício intacto em meio a grandes estragos.
O uso do termo “milagre” é comum diante de fenômenos que parecem sobrenaturais: na grande maioria dos casos, porém, o uso dessa palavra é bem intencionado, mas, como termo técnico, é precipitado e equivocado.
Milagres são fenômenos cientificamente inexplicáveis que contradizem as regras da natureza conforme as conhecemos. Para que algum fenômeno possa ser oficialmente declarado como de caráter sobrenatural por parte da Igreja, são necessários prudentes e detalhados estudos. A Igreja segue critérios científicos bastante rígidos para afirmar algum milagre. Os milagres de cura, por exemplo, chegam a demorar décadas até serem reconhecidos. Os fatos precisam ser cuidadosamente estudados por médicos, revisados por cientistas (na maioria dos casos, laicos e até mesmo ateus), expostos às críticas públicas e, só depois de feitos todos os estudos científicos, a própria Igreja faz a análise teológica mediante o trabalho das suas comissões de especialistas em teologia.
Aliás, você pode conhecer um pouco mais sobre a delicada avaliação de supostos milagres por parte da Igreja no seguinte artigo sobre os 7 critérios para se declararem milagrosas as curas que acontecem no santuário de Lourdes:
Então é um sinal?
A igreja de “Nossa Senhora da Vitória” intacta após a devastação de um grande incêndio florestal pode ser considerada então um “sinal”, se não um milagre?
Entendendo-se por “sinal” aquilo que carrega um “significado”, certamente não há erro em dizer que sim, é um sinal natural – ou seja, um fato raro e chamativo, mais ainda assim “previsto” na ordem natural das coisas. Esse tipo de fato, por mais que seja inusitado ao nosso olhar, significa primariamente a própria existência de uma ordem natural – e isto já é grandiosamente instigante: existe uma ordem natural em vez de mero acaso.
De fato, não é apenas o sobrenatural que pode nos impactar: a natureza mesma, incluindo a nossa capacidade natural de admirar o belo, também tem muito a nos dizer, dado que o fascínio da natureza, em si mesmo, já nos remete a uma das perguntas-chave da filosofia e da ciência: qual é a origem de tudo isso?
Um acontecimento chamativo, mas explicável pela ordem natural das coisas, pode servir como “gatilho” para reflexões importantes.
O cristão acredita que Deus nos fala através de sinais, sejam naturais, sejam sobrenaturais, e que Ele sempre deixa à liberdade de consciência de cada um a decisão final de como interpretá-los. Os próprios ateus, aliás, costumam enfatizar que as tragédias são uma “prova” de que Deus não existe, apelando para a sua “fé” na inexistência de Deus com base em sinais passíveis de interpretações pessoais (que, aliás, cientificamente falando, não são válidos como provas).
Para quem crê na inexistência de Deus, tudo é e será sempre mero acaso e falta de sentido. Para quem acredita em Deus e no sentido sobrenatural da existência, tudo é e será sempre um grande milagre, testemunhado por uma abundância de sinais repletos de sentido.
“Narram os céus a glória de Deus, e o firmamento anuncia a obra de Suas mãos” (Salmo 18, 2).
Um sinal de esperança para o Havaí
A Igreja Católica tem uma história rica no Havaí. A paróquia de Maria Lanakila é uma parte importante dessa história, tendo sido fundada logo após a chegada dos padres católicos a Maui em 1846. A igreja atual foi construída sobre a fundação da igreja original em 1927.
Muitos moradores já declaram que a resistência da igreja é, sim, um sinal de esperança. “Acredito firmemente que Lahaina será reconstruída”, disse um comentarista no TikTok, completando, em relação à igreja, que “esta é a confirmação. Ele está nos chamando para sermos salvos. As portas da igreja (estão) abertas”. Outro comentarista, via Facebook, fez votos de 4 a igreja intacta possa ser “o farol de esperança para o povo de Lahaina”.
Fonte: Aleteia
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