Evandirce faleceu uma hora e meia depois que padre foi proibido de entrar no hospital, segundo relata o marido — Foto: Arquivo pessoal
Em entrevista ao G1, padre disse que se sentiu humilhado e culpou hospital pela morte. Hospital se defende e afirma que padre não explicou o motivo de querer entrar.
Por G1 Santos
06/07/2020 05h01 Atualizado há 14 horas
Um padre foi impedido de entrar em um hospital em Praia Grande, no litoral de São Paulo, para dar extrema-unção a uma idosa, de 79 anos, a pedido do marido dela. Evandirce de Carvalho havia tido um Acidente Vascular Cerebral (AVC) e morreu cerca de uma hora depois que o sacerdote foi proibido de entrar na unidade, segundo relatou o esposo ao G1. O hospital nega a afirmação do padre e diz que o sacerdote não disse que a visita teria cunho religioso.
"Um senhor daqui da comunidade me procurou por volta das 22h30 de sábado (4). Ele estava desesperado porque a esposa teve um AVC e estava internada no Hospital Irmã Dulce", diz o padre Joseph Thomas, de 59 anos.
De acordo com o padre, que é da Paróquia Nossa Senhora das Graças, localizada na Cidade Ocian, o idoso estava em um momento muito difícil e passou os últimos dias se dedicando completamente aos cuidados com a esposa. O sacerdote afirma que entrou em contato com o hospital antecipadamente, perguntando que horário poderia visitar a idosa para dar a extrema-unção, e uma enfermeira o afirmou por telefone que ele poderia ir às 15h deste domingo (5).
Porém, quando ele e o marido da internada chegaram a unidade, ele foi proibido de entrar na ala que ela estava. "Eu tenho crachá para entrar no hospital, mas mesmo apresentando lá na hora, não deixaram", relata.
Padre explica que tem crachá que permite entrada em hospital e que direito é garantido por lei — Foto: Arquivo pessoal
"Ele [marido da idosa] disse para o pessoal do hospital: 'minha mulher está morrendo, está nos últimos momentos e eu gostaria que o padre pudesse dar a extrema-unção a ela, por favor, deixe', mas eles falaram que eu estava proibido de entrar devido ao coronavírus", relembra o sacerdote.
De acordo com a lei 9.982, sancionada em julho de 2000 pelo Congresso Nacional, está garantido "aos religiosos de todas as confissões o acesso aos hospitais da rede pública ou privada, bem como aos estabelecimentos prisionais civis ou militares, para dar atendimento religioso aos internados."
A lei também deixa claro que "os religiosos chamados para prestar assistência nas entidades devem acatar as determinações legais e normas internas de cada instituição hospitalar ou penal, a fim de não por em risco as condições do paciente ou a segurança do ambiente hospitalar ou prisional".
O padre afirma que destacou esse direito da paciente, e disse que iria rapidamente dar a unção e voltaria, mesmo assim relata que foi impedido. "A equipe do hospital ligou para o chefe da segurança, que também proibiu. Voltei para casa e fiquei muito triste com a situação. Até deixei recado para eles e disse que se algo acontecesse, seria culpa deles. Porque eu só estava fazendo minha parte, que é garantida por lei", relata.
"Hospitais não respeitam"
De acordo com o sacerdote, essa não é a primeira vez que ele ou outros padres são impedidos de entrarem em hospitais. "Já teve casos de padres serem humilhados. Depois de várias confusões, conseguimos crachá para entrar sem nenhuma barreira há cerca de cinco anos. Mas tem hospital que não respeita e não autoriza. Essa família da idosa quer até fazer queixa do que aconteceu no local", conta.
Joseph afirma que se sentiu mal e humilhado com a situação. "Eu fui até no horário de visita, para não ter problema. Então fiquei bem chateado, porque nunca saio na rua, foi nesse caso especial que sai, com uso de máscara e álcool, para ajudar a família. Estou revoltado", destaca.
"É ridículo acontecer isso. O padre foi com todo carinho dar a unção para a minha mulher, que estava com estado grave. Ele conhecia ela há muitos anos e nós fazíamos parte até do coral da igreja. Uma hora depois que ele foi impedido de entrar, ela morreu", relata o aposentado Manoel de Carvalho Neto, de 61 anos, marido da idosa.
Hospital
Em nota, a direção do Hospital Municipal Irmã Dulce afirma que, de acordo com informações colhidas com a equipe da unidade, houve um questionamento por parte de um padre na recepção do hospital se as visitas a pacientes estavam liberadas, sem informar o motivo específico da visita ou qualquer outro detalhe.
Segundo o hospital, a equipe da unidade então informou detalhadamente o plano de contingência devido à pandemia de Covid-19, que é baseado no Decreto Municipal N. 6922, de 19 de março de 2020, que "Declara situação de emergência no Município de Praia Grande e define medidas temporárias de prevenção ao contágio e enfrentamento da Pandemia decorrente do Coronavírus (COVID-19)”. O artigo 5 deste decreto prevê que ficam suspensas, por prazo indeterminado, “as visitas aos pacientes internados no Hospital Irmã Dulce e Unidades de Pronto Atendimento”.
O hospital diz que em nenhum momento o padre informou que se tratava de um caso de extrema-unção, ou visita religiosa tradicional, apenas se retirando da unidade após receber as informações. Afirma ainda que caso a equipe tivesse sido notificada disso, a entrada seria liberada, mediante a adoção de todas as medidas de segurança cabíveis. A direção do Irmã Dulce diz que segue à disposição para maiores esclarecimentos.
Padre e marido de idosa alegam que explicaram que visita seria para extrema-unção e mesmo assim houve a proibição — Foto: Reprodução/Facebook
Fonte: G1
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