“Se vê claramente que, quer o produtor como todos aqueles que estiveram envolvidos na produção do filme, trabalharam para transmitir esta mensagem e é uma mensagem ligada com aquilo que o filme conta, um chamado para que a Igreja faça aquilo que desde 2002 - contemporaneamente a estes acontecimentos que o filme conta - começou a fazer. Desde o final dos anos 90, o Cardeal Ratzinger, como Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, havia percebido que a Igreja não podia mais, nem tolerar estes abusos e nem o acobertamento deles por parte dos bispos. E assim, Joseph Ratzinger, depois como Papa Bento, deu grandes passos para tornar a Igreja uma instituição transparente e comprometida na luta contra os abusos. Depois, o Papa Francisco seguiu na linha do Papa Bento, fortalecendo a legislação da Igreja, instituindo a Pontifícia Comissão para a Tutela dos Menores. O Papa já colocou em prática algumas medidas e aguardamos ulteriores progressos nesta mesma linha, que darão certamente a mensagem clara de que a Igreja Católica na sua liderança se deu conta da gravidade da situação e quer e deve continuar a luta pela justiça e para que não existam mais vítimas de abuso”.
RV: Portanto, podemos dizer que desde os acontecimentos que foram narrados pelo filme, muito foi feito pela proteção dos menores, pela Santa Sé e pelas Igrejas locais em todo o mundo?
“Sim, aquilo que a Santa Sé fez é muito evidente: temos outras normas, temos leis mais severas, temos as cartas circulares da Congregação para a Doutrina da Fé que pedem a todas as Conferências Episcopais para enviarem os esboços de suas linhas de ação sobre como encontrar as vítimas, o que fazer com os que abusaram, como trabalhar para a prevenção dos abusos. Muito foi feito, por parte da Santa Sé, e depois também por algumas Igrejas locais. Motivo pelo qual, um filme como este e também as palavras pronunciadas na premiação, certamente dão um ulterior impulso a este nosso trabalho que, por exemplo, iniciamos a partir de 2012 aqui na Gregoriana com encontro internacional, o Simpósio internacional “Rumo à cura e à renovação”, que contou com a participação de 110 bispos de todas as Conferências Episcopais do mundo e que foi um primeiro passo também para as áreas da África e da América Latina, onde o tema, naquela época, ainda não havia chegado. Com a instituição do nosso “Centre for Child Protection”, o Centro para a proteção dos Menores, queremos trabalhar para construir pouco a pouco uma competência local, isto é, pessoas que saibam como reagir, como criar espaços seguros para as crianças e os adolescentes....”.
RV: Que acolhida teve este filme por parte dos homens da Igreja que foram – e estão – comprometidos em enfrentar os abusos sexuais?
“Uma voz muito autoritativa que se pronunciou é a do Arcebispo de Malta, Dom Charles Scicluna, que por dez anos foi Promotor de Justiça e foi a pessoa empenhada na investigação destes crimes cometidos por sacerdotes. Ele, há alguns dias, disse publicamente que recomendaria a todos, também aos bispos, para assistirem este filme. O mesmo disse também um bispo australiano... Existe portanto um grande apreço pelo filme e obviamente também um apreço pela mensagem e o modo como é transmitida a mensagem. Estes bispos recomendam aos seus irmãos para assistirem este filme, portanto é um forte convite para refletir e a levar a sério a mensagem central, isto é, que a Igreja Católica pode e deve ser transparente, justa e comprometida na luta contra os abusos e que deve comprometer-se para que não se verifiquem mais. É importante entender que devemos mudar o nosso comportamento que em italiano pode ser expresso com aquela famosa palavra: “omertá”. Não falar, querer resolver tudo varrendo prá baixo do tapete, esconder-se e pensar que tudo passará. É necessário entender que não passará: devemos nos dar conta de que devemos ter muita coragem e capacidade de enfrentar as coisas, encarando-as de frente, ou um dia, cedo ou tarde, seremos obrigados a fazê-lo. E penso que esta seja uma das mensagens centrais deste filme”. (JE)
Jornal do Vaticano se pronuncia sobre o Oscar de
Spotlight e “mensagem” do produtor ao Papa
Spotlight e “mensagem” do produtor ao Papa
“Este filme deu voz aos sobreviventes. E este Oscar amplifica essa voz, a qual esperamos que se converta em um coro que chegue até o Vaticano. Papa Francisco, é hora de proteger as crianças e restabelecer a fé”, disse o produtor Michael Sugar ao receber o prêmio.
O filme Spotlight trata sobre a investigação jornalística que revelou o escândalo de abusos sexuais na Arquidiocese de Boston, Estados Unidos, em 2002. Além do Oscar de melhor filme, ganhou o prêmio de melhor roteiro original.
Em um artigo assinado por Lucetta Scaraffia, LOR explica que o filme Spotlight não ataca à fé católica e inclusive considera como um sinal positivo que seus produtores confiem na gestão do Papa Francisco acerca deste tema delicado.
Spotlight “não é anticatólico como escreveram, pois expressa a comoção e a profunda dor que os fiéis enfrentam ao descobrir estas realidades terríveis”, indica Scaraffia.
Entretanto, esclarece que a narrativa do filme “não aprofunda na longa e perseverante batalha que Joseph Ratzinger, como Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé e como Papa, empreendeu contra a pedofilia na Igreja”.
Scaraffia admite que “um filme não pode contar tudo” e “as dificuldades que Ratzinger enfrentou somente confirmam o tema do filme, que é que com muita frequência as instituições eclesiásticas não souberam reagir com a determinação necessária para enfrentar estes crimes”.
A autora recorda que “as crianças são seres vulneráveis e, portanto, principais vítimas de abusos, inclusive nas famílias, círculos esportivos e escolas seculares. Nem todos os monstros usam batinas. A pedofilia não necessariamente surge do voto de castidade”.
“Entretanto, ficou claro que na Igreja alguns estão mais preocupados com a imagem da instituição do que com a gravidade dos fatos”, acrescentou.
Em seguida, Scaraffia precisa que “isto não pode justificar a gravíssima culpa dos que, enquanto eram vistos como representantes de Deus, usaram sua autoridade e prestígio para explorar os inocentes”.
A autora destaca o valor do filme ao contar estes detalhes e dar espaço “à devastação interior que estes atos geram nas vítimas, que já não têm um Deus a quem pedir ajuda”.
Sinal positivo
Para a autora, o chamado do produtor Sugar ao Papa na cerimônia do Oscar “deve ser visto como um sinal positivo: ainda há confiança na instituição, há confiança em um Papa que continua a limpeza iniciada por seu predecessor, que então ainda era cardeal. Ainda há confiança na fé que tem como centro a defesa das vítimas e a proteção dos inocentes”.
Em outro artigo publicado pelo LOR e assinado por Emilio Ranzato, destaca-se que Spotlight “não é um filme anticatólico, pois não se refere em si ao catolicismo, mas é provável que seja visto como um filme contra a Igreja porque seu tom normalmente tende a generalizar e generalizações são inevitáveis quando contam histórias em apenas duas horas”.
Segundo Ranzato, “é um filme que indiscutivelmente tem o valor de reportar os casos que, sem dúvida, devem ser condenados. E o faz em detalhe, sobre a base de uma documentação substancialmente séria e crível”.
Fonte: ACI digital
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